Revista Rua


"Pra tá aqui tem que montar, desmontar e carregar". Mobilidade, território e cotidiano do trabalho na feira de artesanato da Avenida Beira-mar, Fortaleza (CE)
"To be here one has to assemble, to disassemble and to carry": Mobility, territory and labor quotidian in the craft fair, on Beira-mar Avenue, Fortaleza (CE)

Luiz Antonio Araújo Gonçalves

Haesbaert (2007, p.7) esclarece que a territorialidade torna-se algo mais amplo do que território, de modo que “a todo território corresponde uma territorialidade, mas nem toda territorialidade implica na existência de um território”. Assim, enquanto o território pressupõe uma base material, concreta, a territorialidade implica em um “[...] referencial territorial (simbólico) para a construção de um território, que não obrigatoriamente existe de forma concreta”.
O cotidiano da feira, nesse sentido, também é marcado pelo movimento dos vendedores ambulantes no calçadão que revela uma territorialidade conflituosa entre estes e os feirantes. Dentre outros fatores, isso se dá pelo fato de o feirante ter que recolher taxas à municipalidade em função da ocupação do espaço público, diferentemente do vendedor ambulante que está “livre” dessa obrigação. Nesse embate, manifesta-se a dimensão do território com a demarcação de fronteiras nem sempre visíveis a olho nu, mas percebida no movimento dos corpos, dos olhares e acordos forjados no espaço vivido para uma convivência menos irascível.
Por outro lado, os vendedores ambulantes, inseridos na área do calçadão, no entorno da feira, estabelecem territorialidades mediante uma mobilidade compulsória. Para permanecerem naquele espaço, muitos ambulantes utilizam o próprio corpo como marco de sua territorialização para vender seus produtos diante da impossibilidade de fixação e imposição de sua mobilidade pelo poder público.
A condição de instabilidade constante e da imposição do movimento, todavia, fez com que estes trabalhadores, ante a necessidade de sobrevivência, buscassem traçar estratégias espaciais no sentido de resistir à norma urbana e permanecer trabalhando no calçadão.
          Haesbaert (2006, p.236-237), nesse sentido, defende uma concepção mais dinâmica de território em que se pode falar em uma territorialização no movimento, reconhecendo que a “[...] territorialização pode ser construída no movimento, um movimento sobre o qual exercemos nosso controle e/ou com o qual nos identificamos”. Entende-se que esses trabalhadores, feirantes e vendedores ambulantes, se territorializam pelo movimento, tanto pelo movimento de montagem e desmontagem das barracas da feira quanto pelo movimento dos ambulantes no calçadão, lado a lado de uma fiscalização que não lhes permite parar.