Revista Rua


Do silêncio angustiante aos sentidos desviantes: Subversão discursiva na microesfera do exercício de poder
(Of the silent distressing to the senses deviant: Discursive subversion in the microsphere of the exercise of power)

Camila Targino e Souza, Cristina Teixeira Vieira de Melo

desafogo sexual, para estes vastos e grosseiros gineceus, que são as senzalas fazendeiras. Estas regurgitam de um femeaço sadio e forte, onde, ao par da índia lânguida e meiga, de formas aristocráticas e belas, figura a negra, ardente, amorosa, prolífica, seduzindo, pelas suas capacidades de caseira excelente, a sagacidade frascária do luso.(Oliveira Viana, in: WERNECK , 1984: 142). 
 
Na imagem em questão, o discurso da lascívia da mulher negra se faz presente através do bebê negro. Vale registrar que a mucama não serviu somente à boa-venturança de um encontro amoroso, mas à ampliação do patrimônio econômico através da procriação de crianças miscigenadas. Fábio Lopes (2006: 9), aproximando Freyre e Foucault, usa a expressão o “corpo no jogo de poder” para falar da tática da miscigenação na formação da paisagem colonial do Brasil oitocentista. Segundo ele, a mucama, implicada nesse jogo de prazer, funcionou também como estratégia de ampliação da “criadagem” e favoreceu a ocupação do país. Responde-se, assim, a uma necessidade material – ocupar o território e açambarcar os nativos – com uma estratégia precedida, é claro, por condições de emergência, mas não por uma inteligência centralizada que a conceba e a implemente. Rigorosamente falando, estamos diante do que Foucault chamou de ‘uma estratégia sem estrategista’. (LOPES, 2006: 11).
Freyre comenta que a reação da sinhá para com a escrava que ocupasse o papel da negra licenciosa poderia ser tirânica. Esperava-se, socialmente, que seu comportamento em relação a uma criança que, por ventura, nascesse da união de uma mucama com o senhor-de-engenho fosse rude, ou ao menos de repúdio.
 
Quanto à maior crueldade das senhoras que dos senhores, no tratamento dos escravos, é fato geralmente observado nas sociedades escravocratas. Confirmam-no os nossos cronistas. Os viajantes, o folclore, a tradição oral. Não são dois nem três, porém muitos os casos de crueldade de senhoras de engenho contra escravos inermes. Sinhá-moças que mandavam arrancar os olhos de mucamas bonitas e trazê-los à presença do marido, à hora da sobremesa, dentro da compoteira de doce e boiando em sangue ainda fresco. Baronesas já de idade que por ciúme ou despeito mandavam vender mulatinhas de quinze anos a velhos libertinos. Outras que espatifavam o salto de botina nas dentaduras de escravas; ou mandavam-lhes cortar os peitos, arrancar as unhas, queimar a cara ou as orelhas. (FREYRE, 1970: 362).
 
Como se percebe, a reação das sinhás em relação aos casos extraconjugais do marido era um misto de subordinação e insubordinação. Por exemplo, uma das interpretações possíveis para esta imagem, mais próxima de uma história oficial, é a de