Revista Rua


Arte de viver de narradoras de outro Javé chamado Guriú
Art of living of other narrators of Yahweh called Guriú

Glória Freitas

existem raízes e nem o começo, mas começos para o aparecimento dos dramas, das dramistas e das mestras. As experiências foram se dando em encontros de mulheres já experimentadas em representar as comédias de drama e as meninas que resolviam aprender movidas pelo desejo de vir a ser uma boa dramista.
Procurando a raiz, encontreiuma estrutura de mangue que amplia as histórias várias do primeiro aparecimento de dramas em Guriú. E, sendo assim, viajando pelo manguezal, foi possível vivenciar o entendimento que servia à paisagem exterior e a minha condução ou condição de pesquisadora, apoiando-me em Deleuze e Guattari quando assinalam que um rizoma:
 
[...] não começa nem conclui, ele se encontra sempre no meio, entre as coisas, inter-ser, intermezzo. A árvore é filiação, mas o rizoma é aliança, unicamente aliança. A árvore impõe o verbo “ser”, mas o rizoma tem como tecido a conjunção “e...e...e..”. Há nesta conjunção força suficiente para desenraizar o verbo ser (2004a, p. 37).
 
 Tentando criar um entendimento que respondesse a indagação “Como isso apareceu aqui?”, ouvi a história de uma Rosa que, quando falava, guardava um segredo e este segredo era um livro dos dramas cantados e o carregava debaixo do braço, nas viagens acompanhando as suas dramistas, mestra que ela era e de muita responsabilidade. Trazia a pé as dramistas lá das “praias de cima, da Barrinha”.
Essa mestra é Rosa Carvalho, nascida em 1932, que um dia encontrou um livro de dramas. Tinha quinze anos e foi pedir a Luci que lhe ensinasse os dramas. Recebeu desta várias comédias que foram transcritas para um caderno. Tal caderno, que ela cognominava de livro, existiu até o tempo em que adoeceu. Uma espécie de livro que comprovaria sua intensidade por viver.
Nunca foi dramista, só foi mestra de Manuela e Rita (suas irmãs). Rita explicou que era assim, Rosa não quis ir para fora da empanada e sambar tal qual baiana. Era o seu jeito de ser, de assim ser, de levar os dias a conduzir as irmãs e outras companheiras para as apresentações por diversas localidades do litoral oeste, recolher dinheiro e dividir com as participantes do grupo. Rosa era aquilo que denominamos hoje de produtora teatral. E suas irmãs eram atrizes.
Aos vinte anos, prostrou-se por longo tempo, uns dezoito anos. Estava costurando, emendando uma roupa de retalhos. Rita, sua irmã, não estava em casa, vou convocada para animar uma farinhada. Tempo de farinhada é a hora de transformar a colheita de mandioca em farinha para fazer farofa ou pirão e goma para tapioca.