Revista Rua


A homoafetividade no discurso jurídico
The homoaffection in the legal speech

Débora Massmann

(1992) propõe a palavra homoerotismo[4]. No entanto, sua alteração não consegue ainda se libertar dos sufixos descritos acima. Deve-se destacar, porém, que o mérito de sua proposta está no deslocamento do sexual para o erótico[5].  
É ainda na busca por novas formas de dizer as relações entre pessoas do mesmo sexo que, no domínio jurídico, inaugura-se uma terminologia que consegueretirar a carga semântica do sufixo “-ismo” e, além disso, desloca a designação do campo sexual para o afetivo. Surge assim, a palavra homoafetividade. A autoria deste neologismo é atribuída à Desembargadora Maria Berenice Dias[6]. De acordo com Dias, a terminologia empregada para designar as relações entre pessoa do mesmo sexo é discriminatória e essa marca da discriminação “resta evidente na omissão da lei em reconhecer direitos aos homossexuais. A negativa do legislador revela nítida postura punitiva, pois condena à invisibilidade os vínculos afetivos envolvendo pessoas da mesma identidade sexual”[7]. Quando questionada sobre a criação e a aceitação do neologismo, Dias[8] assinala que “houve uma rejeição inicial do movimento homossexual ao termo homoafetivo. Parecia que eu estava querendo cobrir o aspecto sexual. Na realidade, eles continuam sendo homossexuais, mas têm com o outro vínculos homoafetivos”.  Estabelecendo o afeto como elemento central na designação das relações entre pessoas do mesmo sexo, Dias situa juridicamente os relacionamentos homoafetivos na esfera da família. Para a autora, “família, no conceito atual, é de caráter afetivo, portanto, esse tipo de união [a união homossexual] também está dentro do conceito de família”[9]
Apesar do advento de novas formas de dizer e das tentativas de deslocamento de sentidos na terminologia empregada para designar as relações entre pessoas do mesmo sexo, nota-se que a sociedade ainda resiste. Ela ainda está impregnada de uma memória cuja gênese é o século XIX, época da origem do termo homossexual e de sua


[4] De acordo com Freire (1992), trata-se aqui da retomada do termo homoerotismoque já havia sido empregado pelo psicanalista húngaro Sandor Ferenezi na obra “L’homoérotisme: nosologie de l’homossexualité masculine”, in Oeuvres completes, tomo II: 1913-1919. Pauyot, 1970.
[5] Para mais informações, consulte Freire (1992).
[6] Segundo Dias, o termo aparece pela primeira vez na obra intitulada “União Homossexual, o Preconceito e a Justiça”, cuja primeira edição é do ano de 2000. O advento da expressão homoafetividade no domínio jurídico se deu na primeira decisão judicial que reconheceu direitos sucessórios ao parceiro sobrevivente, que data de 14 de março de 2001 (AC 7000138982, Rel. Des. José Carlos Teixeira Georgis).
[9] Idem.