Revista Rua


A deriva de sentidos de "Terra da luz" no pós-governo mudancista: Uma análise do vídeo Ceará, terra da luz
The drifting of meanings of "Terra da Luz" in the post-changing government: an analysis of the video Ceará, Terra da Luz

Aline Maria Freitas Bussons

Imagina um lugar lindo todo colorido/ pintado na mais bela tela pelo criador/ Imagina o meu lugar dos sonhos o meu paraíso/ As cores da felicidade sorrindo pra você /Imagina meu porto seguro minha alegria/ Eu agradeço todo dia eu tenho amor e paz/ Daqui o mundo é tão bonito pode ter certeza/ Tanta beleza, não troco por nada/ Eu sou feliz demais!
 
Tal homogeneização é construída nas injunções de um dizer que silencia outros dizeres oriundos de outras formações discursivas. O Ceará seco, tórrido, “feio” não é dito nos versos acima, como foi dito em outros cantados, inclusive por Fagner, também noutros tempos, naturalmente (e.g.,“enquanto a minha vaquinha tiver o couro e o osso...”). O espaço mostrado é “um lugar dos sonhos”, um “paraíso”, “um lugar lindo” que traz “as cores da felicidade sorrindo pra você”. As marcas de imperativo, que aparecem, repetidas vezes, em “imagina”, também atestam o autoritarismo deste discurso, além da construção “pode ter certeza!” que podemos parafrasear por “tenha certeza”, trazendo o imperativo numa verdade inquestionável. Os outros verbos, no indicativo, asseguram as qualidades do estado, ao mesmo tempo em que também garantem a felicidade dos sujeitos (cearenses) que lá se encontram: “eu agradeço todo dia”, “eu tenho amor e paz”, “não troco por nada”, “sou feliz demais”.
As imagens dos sujeitos que proferem estas assertivas também significam na sua materialidade. A imagem de Raimundo Fagner, por exemplo, produz efeitos de sentido de sucesso e modernidade no atravessamento dos discursos regionalista e nacionalista, isto porque, devemos considerá-la como uma construção discursiva dos governos das mudanças. Fagner é um cantor cearense de representatividade nacional que, não obstante já possuir uma construção imagética de artista de sucesso desde o movimento “Pessoal do Ceará”, nos anos de 1970, teve sua imagem ressignificada no pós-governo das mudanças. A posição sujeito cantor-cearense-brasileiro de uma formação discursiva(FD) determinada (sertão/seca) migra para outra FD que valoriza o litoral e silencia a seca.   Investigando a discografia do cantor, percebemos que mar, sol, litoral e sertão são discursivizados, distintamente, antes e depois de 1987.  As temáticas do sol, mar e praias cearenses, por exemplo, pouco (ou nunca) aparecem enquanto uma maravilha natural, enquanto um convite para o restante do Brasil. Ao contrário, no sucesso “Mucuripe”, embora se fale do mar visto do principal porto cearense, Fagner canta “vida, vento, vela, leva-me daqui”. Não há um convite para se visitar praias paradisíacas, na verdade, há uma súplica à vida, à jangada, ao vento de uma fuga – tão relacionada à seca e ao êxodo rural. Ou canta, ainda, a referida fuga nas paisagens do