Revista Rua


A relação centro-periferia na discursividade da cidade
The center-periphery relationship in the discourse of the city

Tiago Roberto Ramos, Renata Marcelle Lara Pimentel

(2004, p.280) afirma, “saída do subúrbio, a cultura popular de massa[14] dá forma à eclosão da cidade”. Isso nos leva a apontar duas expressões significantes do real da cidade.
Primeiramente, nessa cidade marcada pelo fluxo, pelas ruas retas, largas avenidas, pelo “imaginário moderno”, o centro deixa de ser o dominador do espaço. Talvez ainda permaneça como denominador comum, como espaço que concentra as atenções, mas não como espaço essencialmente aglutinador dessas atenções. Ele necessita se adequar a essa nova realidade, tendo que incorporar, na sua dinâmica, aspectos, características e práticas próprias do popular. Ou seja, toda a imagem espetacular e monumental de uma cidade moderna e desenvolvida vê-se indagada, levando a uma re-organização simbólica do espaço urbano de tal maneira que des-constrói esse imaginário ao mesmo tempo em que se forma por ele. 
Em segundo, vemos que essa incorporação acontece em lugares determinados, ou seja, há uma institucionalização do popular, no qual a vida social é algo que se passa na periferia, mas acontece, existe enquanto tal, no centro, pois lá é o espaço em que a representatividade das práticas populares está, de alguma forma, assegurada. O comércio popular que encontramos nesses trajetos é apenas um fragmento que escapa à normatividade e aponta para esse funcionamento discursivo, revelando o real da cidade.
Assim, a relação centro-periferia é uma relação marcada pela negação e afirmação contínua desses dois espaços. Há uma inter-ação que constitui o espaço citadino, o real da cidade, que, por sua vez, sofre com o processo de silenciamento promovido pelo discurso do urbano, que busca organizar esse “caos”, legitimando determinadas práticas e desconhecendo outras.
No trajeto delimitado pelas Avenidas Paraná e Duque de Caxias, e pelas Avenidas Tamandaré e XV de Novembro, notamos uma gama de materialidades em que o popular se corporifica num espaço que é central – é a loja de variedades, o pequeno boteco, a casa de jogo do bicho, a praça central ocupada por práticas “periféricas”, o comércio varejista, o ambulante vendedor de coisa alguma (raízes medicinais, CDs e DVDs), as lojinhas de concerto de coisa qualquer, enfim, são esses espaços que simbolizam a forma como o centro e a periferia se relacionam. Como já apontamos, são


[14] Pelo contexto em que se apresenta na obra, ao usar o termo “cultura popular de massa”, o autor indica se referir a um popular cultural que sofreu transformações ao entrar em contato com a lógica de mercado da indústria cultural.