Revista Rua


O Agente Comunitário de Saúde - Uma História Analisada
The Community Health Agent - An Analyzed History

Carlos Côrrea, Claudia Castellanos Pfeiffer, Adriano Peres Lora

1.INTRODUÇÃO
 
O Agente Comunitário de Saúde aparece no Brasil a partir da década de 90, quando alguns Estados do Nordeste, buscando estratégias para a melhoria das condições de saúde da população, instituem este trabalhador na área. Interessante observar que este lugar nasce junto com a implementação de “ações simples, desenvolvidas e assimiladas nas comunidades, por integrantes delas próprias” (Brasil, 1996; Brasil, 1994). Ou seja, a narrativa de criação do ACS nasce junto com o gesto de intervir, por meio da própria população, na saúde da população[2].
Neste processo, o Agente Comunitário de Saúde (doravante ACS) se reconhece como o profissional que, ao mesmo tempo em que é a voz da “comunidade"[3] (Nascimento e Correa, 2008; Nunes, trad et al., 2002), também é aquele que deve repassar para ela informações que o conhecimento biomédico dispõe (Brasil, 1996; 2001; Brasil, 1994). Desse ponto de vista, esse lugar do ACS deveria articular dois espaços: o da saúde institucionalizada (fundamentada em um discurso biomédico) e o “da comunidade”. Este é o pressuposto[4]. O ACS diz, então, na injunção da intermediação, colocando em relação (de tensão, de contradição, de sobreposição, de apagamentos) os serviços de saúde, a rede


[2] Não se pode deixar de notar que não se trata de qualquer população. São divisões políticas que se dão em um imaginário universal social. É aí que funciona, produtivamente, a referência à “comunidade”.
[3] As aspas são uma forma de marcar um não comprometimento dos autores com o efeito de sentido estabilizado em torno de ‘comunidades’. Essa discussão seria objeto de um outro artigo, mas adiantamos que um dos efeitos do uso de comunidade é o gesto de homogeneizar um grupo ao mesmo tempo que o retira da sociedade. Em termos parafrásticos, dificilmente encontraríamos a designação ‘comunidade’ funcionando na referência a moradores de um bairro rico de uma cidade. Há aí já a primeira pista nos modos de divisão do social e do político que essa designação imprime.
[4] Uma das perguntas que fazemos é justamente a de compreender se desse lugar de onde o ACS enuncia, constrói-se ou não uma outra discursividade ou, mais exatamente, qual é essa discursividade construída por esse lugar. Não é essa a pergunta que norteará o presente artigo, mas ela está no fundo da reflexão.