Revista Rua


A televisão no espaço urbano brasileiro (ou dos processos de constituição de sentidos para a TV no Brasil)
Television in the brazilian urban space (or about the processes of meaning making for TV in Brazil)

Silmara Cristina Dela-Silva

A oposição entre o discurso da modernidade, do desenvolvimento científico e tecnológico em que se insere o dizer sobre a televisão e o discurso religioso é marcado pela expressão “Idade Média” no texto da revista. A resistência da Igreja por meio da proibição de se instalar a torre e a antena de TV no alto do Corcovado, local mantido pela Arquediocese do Rio de Janeiro, é associado a uma atitude “medieval”, enquanto a televisão, simbolizada pela antena na cidade, apresenta-se como a modernidade, o futuro desenvolvimentista do país.
A associação da televisão ao discurso científico, em oposição ao religioso, aponta para a inscrição da TV em um discurso da modernidade, do desenvolvimento técnico-científico que deve ser trazido ao país. Ao inscrever a “televisão no Brasil” na cidade como um espaço de significação, o processo de produção de sentidos para o espaço geográfico não se restringe à significação de uma cidade em particular. Trata-se da cidade considerada enquanto contexto urbano, a cidade em sua relação com a modernidade e o desenvolvimento do país.
A constituição imaginária da TV como símbolo do desenvolvimento do país é reafirmada em outra reportagem, intitulada “A televisão funcionando”, publicada em agosto de 1950, que trata das primeiras transmissões televisivas realizadas em São Paulo. Da mesma forma que nos recortes anteriores, que tratava da instalação de emissora de TV no Rio de Janeiro, no dizer sobre a televisão em São Paulo, a televisão é predicada como de todo o Brasil e da América do Sul, como é possível observar no recorte (3):
 
(3) Tornou-se uma realidade, afinal, a televisão no Brasil. Ou melhor, na América do Sul. Há cerca de quinze dias atrás, a audição de José Mojica no Museu de Arte de São Paulo foi reproduzida para o público paulista pela televisão, e dessa forma coube à capital paulista o privilégio, neste continente, de empregar a mais maravilhosa invenção do século, na tansmissão de um programa de auditório. (O Cruzeiro, 12.08.1950. Grifos nossos.)
 
Embora as primeiras transmissões de TV tenham sido realizadas para a capital paulista, a realidade que se anuncia é “a televisão no Brasil” e “na América do Sul”. A cidade de São Paulo, neste caso, é significada como representante do Brasil e da América do Sul, o que direciona certos sentidos para a cidade em detrimento a outros possíveis: cidade significa o país e até mesmo o continente sul-americano, e não os limites geográficos da capital paulista, onde de fato ocorreram as primeiras transmissões.