Revista Rua


A televisão no espaço urbano brasileiro (ou dos processos de constituição de sentidos para a TV no Brasil)
Television in the brazilian urban space (or about the processes of meaning making for TV in Brazil)

Silmara Cristina Dela-Silva

(7) Dessa forma, o que há pouco tempo atrás parecia um sonho, somente conhecido através das revistas e do cinema, se converteu numa realidade soberba, ao alcance de qualquer um. (O Cruzeiro, 12.08.1950. Grifos nossos.)
 
A disponibilidade da TV para “qualquer um” é reafirmada pelo livre acesso assegurado pela presença de aparelhos receptores instalados em pontos comerciais, como marcado no recorte (8):
 
(8) Centenas de aparelhos receptores foram instalados nas vitrinas dos grandes estabelecimentos comerciais, e nas prateleiras dos bares, cafés e confeitarias. Diante desses receptores, há sempre uma pequena multidão de espectadores... (O Cruzeiro, 12.08.1950. Grifos nossos.)
 
A formação imaginária do sujeito telespectador, no entanto, aquele que de fato pode assistir à televisão por possuir acesso a aparelhos receptores, é expressa no recorte (9), que associa a TV a um produto destinado a um segmento social específico e não da coletividade, como anunciam os títulos das reportagens aqui analisadas:
 
(9) Hoje, na Paulicéia, entre as elegantes da sociedade, existe uma nova fórmula de convite, para os encontros da tarde: Célia Maria telefona para Maria da Glória dizendo: - “Venha tomar chá comigo e assistir à televisão”. (O Cruzeiro, 12.08.1950. Grifos nossos.)
 
A imagem da mulher que recebe as amigas ao final da tarde, associada a integrantes das famílias mais tradicionais, é combinada à moderna tecnologia que representa a televisão, associada ao chá oferecido nos encontros nas residências mais abastadas. A tensão entre paráfrase e polissemia constitui, assim, a imagem do telespectador de televisão: trata-se de um público específico, que possui os receptores de TV em casa, ainda que o novo equipamento seja verbalizado explicitamente como disponível a toda a população, a todo o povo, sentido este reafirmado pela presença da antena em pontos de destaque do espaço urbano. O sujeito telespectador é, assim, o sujeito consumidor, aquele que inicialmente estabelece a relação de consumo com o aparelho de televisão para, posteriormente, consumir os produtos ofertados em sua programação.