Revista Rua


Diante da Lei.. aflição e aprisionamento ao processo
Before the Law... affliction and imprisonment to the process

Carme Regina Schons e Lucas Frederico Andrade de Paula

(...) o sujeito-leitor, ao produzir leituras, o faz determinado pelo imaginário do “lugar social” em que se inscreve. É esse lugar que o lança em um processo histórico de interpretação e de disputa na produção de sentidos, ou seja, os sentidos se produzem com gestos de interpretação. É essa interpretação singular, mas marcada pela historicidade que, para quem lê/ouve/interpreta, se apresenta como “o sentido”. (p.310)
 
A próxima seção é dedicada à análise do corpus, consoante os procedimentos metodológicos descritos a seguir.
 
Análise do corpus
A partir da seção do discurso-transverso, seguimos com a análise do primeiro recorte. Trata-se do conto Diante da Lei do escritor tcheco Franz Kafka (1965), trazendo o pensamento no início do século XX. Em seguida, analisaremos o recorte de uma notícia contemporânea publicada no jornal Estadão.
É preciso salientar que a leitura dos dois recortes permite não só traçar um paralelo com algumas questões teóricas da Análise de Discurso, mas também verificar quais os elementos pré-construídos que configuram domínios de saber no institucional (a justiça dos homens, a justiça divina) e que assumem diferentes formas no corpo da justiça criminal e no corpo social.
Primeiramente, apresentamos um resumo do recorte 1, a fim de situar a análise. O conto narra longa espera de um camponês que tenta entrar na lei, mas sofre a intervenção de um guarda que está na porta. O camponês espera muitos anos pela oportunidade de entrar na lei, tendo apenas o guarda como obstáculo e companhia.
Partindo da materialidade linguística, juntamente com as concepções teóricas da AD, baseada em Pêcheux (1988), iniciamos nossa leitura do corpus pelo título do conto, para um primeiro recorte possível de análise.
O título Diante da lei nos dá a primeira pista semântica sobre as condições de produção e de formação em que se ancora a discussão do texto; do mesmo modo, nos informa do que se trata a narrativa kafkiana. A locução prepositiva diante de indicia a posição do sujeito que vislumbra alguma coisa de frente. A segunda palavra é lei, um conjunto de normas jurídicas do sistema vigente, mas o autor, nesse caso, refere-se a uma instituição pública, ao lugar, ao interior desse lugar em que a lei se encontra; portanto, a leitura do enunciado Diante da lei resulta na informação temática da narrativa, mas também na forma como o autor tratou a questão jurídica, materializando-a dentro da casa em que a lei está - como se pode ler no conto.