Revista Rua


Sujeito histórico e amor eterno: a significação da figura materna em músicas sertanejas
Historic subject and mother`s love: the meaning of the maternal figure in country songs

Maciel Francisco dos Santos e Telma Domingues da Silva

Ao falar da mãe, o locutor sertanejo, na sua posição de sujeito filho, mostra tanto seu desejo de completude como o desejo de completude da mãe. A mãe, inclusive, aparece como um sujeito ainda mais dotado dessa completude ilusória, seu amor é incondicional e eterno. Esse é um ponto importante para entendermos a significação da figura materna nessa sua formulação específica nas letras de música sertaneja. 
 Na sequência, mostraremos a relação desse discurso amoroso com a exterioridade, o que nos possibilita compreender como nesse discurso (se) produz sentido, dada a relação específica deste com a historicidade. Ou seja, as questões de sentido aqui apontadas remetem à significação desse sujeito amoroso enquanto “sujeito caipira” (locutor sertanejo), em suas relações com as discursividades do urbano e do rural, como meios/ culturas distintas, em suas especificidades. 
 
O locutor sertanejo separado de sua mãe: um sujeito entre o rural e o urbano
Essa relação do locutor sertanejo com as discursividades do urbano e do rural é importante para entendermos o discurso amoroso do filho com relação à separação, marcada no discurso por um distanciamento físico que gera saudade, dor e sofrimento. A distância geográfica e temporal que afasta o locutor sertanejo de sua mãe significa a – e ao mesmo tempo é significado pela – mudança de um ambiente rural para um ambiente urbano, em que a cidade é frequentemente o lugar de destino do sujeito que deixa o campo. Sendo o campo e a cidade constituídos por discursividades específicas, a mobilidade do sujeito filho do rural para o urbano interfere na sua constituição enquanto sujeito caipira, e consequentemente na significação que ele faz da figura materna.
Payer (1996) nos diz que “a mobilidade geográfica dos indivíduos requer (e produz) enquanto condições de produção dos sentidos, uma alteração também na orientação simbólica, quanto às imagens que o sujeito faz de si, do outro, dos objetos de referência” (p. 96). Assim sendo, podemos dizer que o discurso de amor do filho na cidade ganha uma especificidade marcada por essa alteração na orientação simbólica, como nos diz a autora. Deixando sua mãe no campo, o discurso de amor do filho se intensifica, pois ela não está mais junto dele. E, nesse sentido, o discurso volta-se para o passado, constituindo-se em lamento da ausência do amor materno no presente. Vejamos:
“Eu bem queria continuar ali
Mas o destino quis me contrariar
E o olhar de minha mãe na porta
Eu deixei chorando a me abençoar”