Revista Rua


Sujeito histórico e amor eterno: a significação da figura materna em músicas sertanejas
Historic subject and mother`s love: the meaning of the maternal figure in country songs

Maciel Francisco dos Santos e Telma Domingues da Silva

Além da urbanização e modernização da indústria fonográfica, as comunidades caipiras se tornaram raras, o que também contribuiu para um declínio da temática rural ou para a sua ressignificação. Vejamos um pouco como se constituem essas comunidades, para que compreendamos o seu papel na produção de música sertaneja, papel este que se reflete ainda nas canções atuais, mesmo que de maneira bastante tímida.
 
As comunidades caipiras
De acordo com Ribeiro (1995), as comunidades caipiras se formaram pelos posseiros e agregados, que não tinham condições de legalizar as terras onde viviam. Esses posseiros e agregados tornaram-se responsáveis pela formação dos bairros rurais com formas de trabalho e de lazer próprias, como os mutirões. Hoje em dia, comunidades caipiras como estas, que tinham pouca relação com o mercado, são raras.
Setubal (2005) frisa que a cultura caipira não é homogênea, há variações entre as comunidades. Há, porém, traços semelhantes entre elas, e são estes traços que nos possibilitam caracterizar as sociedades caipiras.
Mesmo sendo raras na atualidade, as comunidades caipiras estabeleceram costumes que refletem nas populações do interior, mais especificamente na região sudeste e centro-oeste. Com a urbanização do país, muito dos seus traços estão hoje ressignificados, é o que nos afirma Setubal (idem):
 
a permanência dessa cultura caipira ou de traços determinantes dela, [...] hoje [...] está transformada e ressignificada. No entanto, ela continua, a nosso ver, como um exemplo de resistência, talvez na maior parte das vezes, de forma inconsciente, pois, apesar de toda a marginalização sofrida, especialmente por parte dos meios de comunicação e da elite da sociedade, essa cultura permanece na alma e concretamente em festas e tradições mantidas pelo povo. Essa concretude se dá pelos aspectos [...] que ainda fazem parte do imaginário de alguns e do dia-a-dia de outros: terra e natureza; linguagem; modo de vida, costumes e comidas; o coletivo e a generosidade; a religiosidade, o tempo, o lazer e as festas (p.131).
 
Como podemos ver, a autora defende que a manutenção dos costumes, mesmo que de forma transformada, é uma forma de resistência do sujeito caipira, como sujeito que, ao se significar e ser significado, significa às margens de uma sociedade que se afirma como urbana (não-caipira). Acreditamos que a música sertaneja, mesmo a moderna, é uma dessas formas de resistência, pois afirma essa diferença para com o imaginário de pertencimento ao urbano e se mostra, ao mesmo tempo, como parte integrante do meio urbano.