Revista Rua


Sujeito histórico e amor eterno: a significação da figura materna em músicas sertanejas
Historic subject and mother`s love: the meaning of the maternal figure in country songs

Maciel Francisco dos Santos e Telma Domingues da Silva

exprime pela sua singularidade, pois ele não fala apenas das mães em geral, mas da sua própria mãe.
Pensando essa distinção, podemos considerar que há nas músicas em análise tanto um discurso sobre o amor (sobre o amor de mãe) como um discurso de amor (do filho). Isso varia conforme a música, podendo uma mesma música ser atravessada pelos dois modos de enunciação. Ora o locutor sertanejo fala diretamente com sua mãe, mostrando o amor que sente por ela, ora fala sobre ela com outro interlocutor, demonstrando que a sua mãe ou as mães em geral têm um grande amor por seus filhos. Vejamos alguns recortes que mostram o discurso sobre o amor materno:
 
“Quem é que está sempre contigo
Mesmo sem te ver?”
 
“Passou a mão em meus cabelos
Olhou em meus olhos
Começou falar:
Por onde você for eu sigo
Com meu pensamento
Sempre onde estiver”
 
Note que, nesses recortes, o sujeito não fala diretamente com a mãe. Mas a descrição do amor materno, incondicional e atemporal, funciona aí como demonstração de amor, isto é, faz parte também da mesma “subjetividade mostrada” – segundo as palavras de Orlandi a respeito do discurso amoroso.
Acreditamos que o discurso sobre o amor também apresenta em seu funcionamento semelhanças com o discurso de amor, e mesmo quando o locutor sertanejo fala sobre sua mãe, ele quer demonstrar seu amor de filho e evidenciar o quanto sua mãe o ama, já que exalta esse amor materno. Por isso grifamos a palavra “sempre”, para mostrar outra característica do discurso de amor, que aí se faz presente no discurso sobre o amor: a atemporalidade. O discurso de amor não só é atemporal, mas também repetitivo, significando-se pelos gestos cotidianos, pelos rituais circunstanciais do dia-a-dia, sem isso ele não poderia expressar sua atemporalidade. É pela repetição que o sujeito garante a sua duração, ou melhor, seu sentimento de duração. Essa repetição não é retorno, mas descontinuidade contraditória que se faz pela ruptura e pelo silêncio (ORLANDI, 1990).

Outra característica do discurso de amor é a contradição. Sem dúvida, ela é um dos efeitos mais marcantes desse discurso, e pode aparecer nas formas cristalizadas