Revista Rua


Sujeito histórico e amor eterno: a significação da figura materna em músicas sertanejas
Historic subject and mother`s love: the meaning of the maternal figure in country songs

Maciel Francisco dos Santos e Telma Domingues da Silva

alimente seu desejo de completude, ele acredita ser singular, e essa singularidade no discurso de amor se dá através do outro, do “vínculo com o outro, na remissão à formação discursiva (ORLANDI, 1990, p 85)”. É nesse sentido que o sujeito filho se significa pela mãe e, assim sendo, ambos aparecem como se fossem um, em uma relação de interdependência. Vejamos um exemplo:
 
“Te leva você junto ao peito
Mesmo antes de nascer
Sorri com tua alegria
Chora a sua solidão”
 
Podemos ver que o recorte mostra mãe e filho como dois sujeitos inseparáveis, indissociáveis, a mãe leva o filho “junto ao peito” mesmo antes do nascimento e seu estado emocional depende do estado emocional do filho.
O discurso de amor mais uma vez se dá na contradição, porque, no jogo entre unidade e dispersão, o sujeito, ao subjetivar-se em sua singularidade, acaba se desgarrando de si mesmo. “Nesse desgarramento, amar é deixar-se dizer pelo discurso do outro. Ser significado, (significar-se) pela fala do outro” (ORLANDI, 1990, p. 86). Por isso dizemos que o filho se significa pela mãe, é demonstrando o amor dela que ele demonstra o seu próprio amor. Veremos isso novamente mais à frente.
Apesar da contradição ser uma característica do discurso de amor, nesse recorte que estamos analisando, ela aparece no discurso sobre o amor de mãe. Isso nos mostra que os dois tipos de discurso se confundem nas canções do corpus, ou melhor, estão entrelaçados.
Podemos notar que o locutor sertanejo se desgarra de si e se significa pelo discurso do outro (a sua mãe). Isso acontece porque há um vínculo entre mãe e filho que permite essa apropriação do discurso do outro.
Pensamos que o discurso sobre o amor, embora menos subjetivo do que o de amor, não chega a ser um discurso marcado pelo distanciamento com relação àquilo do que se fala, aqui, no caso, o amor materno. Isso porque, partindo do filho, não se pode dizer que ele tem um olhar objetivo a respeito da figura materna. Mesmo que esse olhar se dê através de um estereótipo, que vai aparecer também na forma de demonstrar o amor, como já vimos, ao mesmo tempo, pelo vínculo que tem com a mãe, vai expressar seu amor de forma marcadamente subjetiva, e aí se aplicam as marcas do discurso de amor que discutimos neste texto.