Revista Rua


Jornal e poesia: o Alencar espelhado no discurso da língua
Newspaper and poetry: the Alencar mirrored in the speech of language

Atilio Catosso Salles

Além ou aquém do estudo desses discursos diversos – monossemeisantes – através dos quais se procura um sentido para as palavras, pela própria exclusão de outros sentidos possíveis, o nível excessivo de deslizamentos, reduzidos a “[...] fenômenos lúdicos, ou acidentais, do lado da recepção, a dimensão do equívoco do dizer” (AUTHIER-REVUZ, 1998, p. 25), produz um efeito especular duplo na linearidade do fio discursivo da língua. Vejamos: jóias preciosas, seiva inesgotável, vasto cabedal, mimo de sua imaginação, deleita o espírito, pureza e elevação dos sentimentos, o coração em toda a gala, esplendor de seus primeiros impulsos, embevecido, esperançosa das emoções elétricas do amor, transmuto perfeito da alma; são expressões que manifestam, na superfície do dizer, as não coincidencias das palavras consigo mesmas, fazendo referência ao “jogo da língua”, citado por Lacan como lalangue, aquela em que se ancora a poesia.
Assim, este espaço não-de-si do século XIX, ao dizer a poesia na/da língua, a partir de jogos da linguagem, mostra, nas produções jornalístico-literárias, um redemoinho de palavras, possível de uma armadilha, da qual escapa ao sujeito, conforme observamos na proposição que segue de Carlos França, publicada no jornal A opinião, ano I:
 
                        (CARLOS FRANÇA, 1878 - ano I)[5]
 
 
Essa propriedade da reflexividade, neste recorte, se manifesta pela retomada da linguagem no interior dela mesma, instaura a incompreensão, os mal-entendidos, a ambiguidade [...], devido à necessidade de fixar o um, tido como transparente da linguagem, negando o estranho a esse não um, o Outro. (AUTHIER-REVUZ, 1999).
Segundo Pêcheux (1983, p.53), toda descrição “[...] está exposta ao equívoco da língua: todo enunciado é intrinsecamente suscetível de tornar-se outro, diferente de si mesmo, se deslocar discursivamente de um sentido para derivar para um outro”. O mesmo se verifica nesse espaço onde são tecidas as homenagens a Alencar, ou seja, o intrincamento das falas dos discursos, sob a forma de um pré-construído ou já-dito, próprio do fio discursivo, que possibilita inaugurar discursos outros, pela tomada de


[5] Era uma lampada fragil – à força de tanta luz – estalou. Carlos França