Revista Rua


Aprendizagens da cidade: corporeidades em intervenções urbanas
Learning City: corporealities in urban interventions

Juliana Soares Bom-Tempo

experienciar da relação de cada corpo com os outros corpos. Através de auto-massagens, de massagens em duplas, em grupo, de direcionamentos musculares, de pesquisas das articulações, nos possibilitamos entrar em um novo corpo, um novo campo corporal, com estranhamentos, rupturas e devires.
Começamos a dançar. Quanto mais nos relacionávamos, nos tocávamos e nos experimentávamos, mais abríamos as percepções dos nossos corpos e realmente entravamos em uma outra relação de consciência dos corpos, como um transe no qual não havia mais um e outro e os objetos, mas tudo compunha um campo, o que Paxton (apud Gil, 2005) chama de plano de imanência da dança. É o plano do movimento que nasce sob a fusão do movimento e do pensamento (consciência do corpo), e com o corpo configurando um espaço infinito na possibilidade de agenciamento de outros corpos. Com essas duas condições, temos o plano de imanência.
O coreógrafo Steve Paxton (apud Gil, 2004) afirma que a consciência possibilitada pela consciência vigil, fenomenológica, vivencia os movimentos corporais de maneiras esburacadas, cheias de lacunas, porque os movimentos sutis dos corpos são rápidos para uma consciência clara. Já na consciência do corpo, não há buracos, mas ela se faz continuamente. A consciência intencional é, portanto, intervalar, mas os intervalos estão preenchidos por movimentos sutis, relacionando com a idéia de repouso e silêncio que discutimos em outro tópico. Assim, para que haja uma consciência contínua dos movimentos, é necessário adentrarmos em um platô de consciência do e pelo corpo, nos abrindo ao movimento fluido que possibilita a construção e a desconstrução de formas e forças, configurando um caleidoscópio vivencial.
Além do desenvolvimento da consciência do corpo, a qual Gil (2004, p.14) chamou de “a parte de trás da consciência”, há outro regime de consciência em que o corpo sensível se transmuta em corpo-consciência. Este seria caracterizado por uma hipersensibilidade, na qual o corpo se abre para captar pequenas sensações dos outros corpos, antes imperceptíveis. Além dessa experiência do corpo hipersensível, o corpo-consciência estabelece uma relação direta com o inconsciente e, assim, os corpos entram em contato e em osmose, misturando-se a outros corpos e a cidade. Há uma mistura entre dois ou mais inconscientes (Gil, 2004). Assim, também ocorre na dança Contato-Improvisação. Há uma comunicação inconsciente; começamos a prever os movimentos dos outros corpos e há uma destituição do ser enquanto separado das coisas; ou seja, tornamo-nos uma massa fluida e passamos a existir em um campo comum, porém, distinto do campo cotidiano, como se criássemos rasgos na cidade que invadíamos com