Revista Rua


Aprendizagens da cidade: corporeidades em intervenções urbanas
Learning City: corporealities in urban interventions

Juliana Soares Bom-Tempo

Nessas articulações, a cidade é autoprodutora e exterior a ela mesma em um processo de ambivalência simultânea. Simultânea em caráter autopoiético, enquanto processo de autoprodução, interfaceando seus desenvolvimentos alopoiéticos, como em busca do outro para se criar, se manter e se articular. Este movimento se dá em uma política exterior, configurando relações de alteridade. Desta forma, corpo-corpos se configuram em dinâmicas complexas; configurações em movimento, em corpos dinâmicos e em fluxos contínuos (GUATTARI, 1993).
Nos múltiplos paradoxos da cidade, os corpos transeuntes habitam micro e macro relações e percepções dessas configurações. Há um processo de invasão da consciência pelo corpo, ao mesmo tempo em que se habita um macro-contexto de consciências intencionais fenomenológicas descontínuas, uma conjugação em que habitam ambas as dimensões sobrepostas e em processo de mistura, macro e micropolíticas agenciadas em corporeidades urbanas. Uma impregnação, um contágio da consciência pelo corpo, que em seguida faz conexões com objetos do mundo externo, mundo urbano, movimentos inconscientes que invadem a consciência através do corpo. Diante disso, frente ao pensamento de Deleuze e Guattari (1995), a díade consciência inconsciência perde qualquer relevância, dispõe a multiplicidade dos encontros com os agenciamentos urbanísticos como uma invasão consciente e inconsciente no corpo e na cidade ao mesmo tempo.  Neste processo, há o início de devir-objeto, devir-cidade, formando, assim, platôs enquanto áreas em que não existe discernimento entre corpos e objetos em um movimento de transmissão mútua de atributos e traços. Consciência, corpo e cidade são atravessados por “tessituras” comuns.
Juntamente a essa dinâmica, acontece uma invasão do corpo em suas micro tensões no corpo do outro, já que, involuntariamente, este outro está imerso em um campo invisível, inconsciente, e, portanto é submetido a uma comunicação inconsciente criando assim movimentos articulados pelas linhas de força do urbano. Isto acontece quando há uma “distração” por parte desse outro e acaba abrindo o corpo a uma invasão, dissolução de aparentes delimitações e separações entre corporeidades e urbanidades. Incorporações são estes processos de afetação e modulação de forças via inconsciente do corpo. Uma espécie de corpo espectral, corpo de afetos, mudo e invisível, apenas podendo ser experienciado a partir das intensidades destes atravessamentos urbanísticos (GIL, 2004).